Por Cristine Delphino
A cachaça hoje tida como produto cultural passou por momentos complicados durante a Revolta da Cachaça, no final de 1660 e começo de 1661, no Rio de Janeiro. O país sofria com a crise do açúcar, motivada pela expulsão dos holandeses das terras brasileiras, em 1654, e os produtores de cana-de-açúcar já não obtiam os mesmos lucros de outrora, além de enfrentarem a alta concorrência. Dessa forma, tiveram que pensar em alternativas para aumentar os seus ganhos, como a intensificação da exploração do produto e aumento do número das plantações.
Os portugueses, que tinham a sua própria bebida conhecida como bagaceira, feita a partir do bagaço da uva, não gostaram nada da concorrência e muito menos da divisão de lucros. Desde antes da crise do açúcar, os colonizadores passaram a tomar medidas para diminuir a ameaça da fabricação da aguardente, foi proibido então o consumo da caninha, em 1635. Mas como os soldados não podiam controlar todo o território ou os principais estados produtores, como o Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia, muitos moradores ignoraram as leis. Doze anos depois, os lusitanos criaram a Companhia Geral do Comércio, acreditando que esta seria uma solução ao problema. A empresa tinha controle de quase todos os produtos e claro, de todas as bebidas alcoólicas, mesmo assim a cachaça vinha prosperando e no mesmo ano passou a ser contrabandeada para a Angola.
Foi então, como última medida, que os lusitanos resolveram proibir a produção da aguardente e do funcionamento dos alambiques, se alguém fosse pego descumprindo as leis da corte, poderia ser preso e extraditado para a África. Para provar que desta vez falavam sério, os portugueses destruíram muitos alambiques e queimaram os navios que transportavam a cana.
No mesmo ano, o então governador do Rio de Janeiro, Salvador Correia de Sá e Benevides, visando o enorme lucro gerado em torno da bebida, liberou o consumo e fabricação da cachaça, porém para usufruir deste benefício, a população teria que pagar impostos considerados abusivos. A cobrança fez com que a Companhia Geral do Comércio ficasse furiosa, mas mesmo assim Salvador de Sá continuou com a prática e durante uma viagem a São Paulo, deixou seu tio Tomé Correia de Alvarenga no poder e pediu para que este colocasse soldados nas ruas para cobrar as taxas, o que deixou a população revoltada. Moradores da região de São Gonçalo do Amarante, organizaram um motim e liderados por um importante fazendeiro, Jerônimo Barbalho, deram inicio a revolução. Foram até a Câmara pedir todo o dinheiro de volta e o fim dos impostos, medida que foi logo aceita por Tomé. Porém, os moradores continuavam insatisfeitos, queriam tirar Alvarenga do poder e contavam com o apoio dos soldados. Alvarenga antecipando-se, fugiu e deixou o governo vazio.
O cargo foi ocupado por Agostinho Barbalho, eleito pela populaçao e que ao longo dos dias mostrou o seu pouco dom político. Logo foi substituído por seu irmão Jerônimo, um político radical que perseguia e executava jesuítas.
Salvador de Sá que acompanhava tudo a distância, pediu reforços e chegando de surpresa ao Rio de Janeiro, retomou ao poder. Montou uma corte marcial, executou revoltosos e concedeu a pena de morte para Jerônimo Barbalho. Através de uma carta, a Coroa portuguesa soube de toda a revolta e do enforcamento do líder, não gostaram da violência e afastaram Salvador do cargo. No mesmo ano, a fabricação da cachaça foi permitida, os alambiques foram reabertos e a cachaça tornou-se símbolo nacional.