Sete décadas depois do início da produção de cachaça em Salinas, um paulista invade o Norte de Minas com a promessa de profissionalizar a cadeia produtiva e fazer com que o produto conquiste os quatro cantos do mundo. Proprietário de uma distribuidora de bebidas em Campinas (SP), o que lhe garante acesso ao mercado, Carlos Sebastião Andriani adquiriu três importantes marcas de cachaça mineira, uma fazenda e uma fabriqueta tendo como objetivo disseminar a venda da autêntica cachaça de Salinas em São Paulo (maior mercado consumidor do produto) e no exterior. O investidor mantém contato com representantes dos Estados Unidos, China, França e Angola e pretende iniciar, até o fim do ano, a venda dos primeiros lotes.
Investidor paulista quer representar pelo menos 56 rótulos de cachaças artesanais de Minas Carlos Sebastião Andriani compra três marcas, uma fazenda e uma fabriqueta na cidade, inicia contato no exterior
Pedro Rocha Franco - Publicação: 18/08/2012
O acesso ao mercado estrangeiro era considerado o principal empecilho para que os produtores da região conseguissem exportar a cachaça. Por enquanto, apenas um rótulo artenasal originário de Salinas é vendido em escala razoável para o exterior. Com isso, a abertura das portas pode ser o primeiro passo para que outras marcas também se beneficiem da chegada do investidor. Outro ponto tido como problemático para que fossem firmados contratos de médio e longo prazo é a falta de estabilidade na safra da cana-de-açúcar. Neste ano, a forte seca reduziu entre 30% e 40% a produção dos canaviais. “A nossa dificuldade era ter acesso a outros mercados. Agora, acho que vamos abrir as portas da exportação e ressuscitar pequenos produtores de cana que desistiram”, afirma o presidente da Associação dos Produtores Artesanais de Cachaça de Salinas (Apacs), Nivaldo Gonçalves das Neves.
O investidor paulista adquiriu as marcas Beija-flor, Salivana e Paladar, além da indústria da Erva-Doce e a fazenda onde era fabricada a Indaiazinha, por cifra que prefere manter em segredo. Ele deve também criar a marca Iê. Mas pretende representar mais de uma dezena das 56 marcas da região de Salinas em sua distribuidora. Para isso, terá 73 pontos de distribuição apenas na capital paulista e pessoalmente deve fazer o contato com representantes de governos estrangeiros e investidores.
No início do ano, o maior produtor de rum da China visitou Salinas, e até o fim do ano Andriani deve seguir para o Oriente para tentar firmar o acordo de exportação. Mas ele adianta que as primeiras parcerias devem ser fechadas com norte-americanos e franceses. A expectativa é de que ainda esse ano se inicie a venda da cachaça artesanal de Salinas para os dois países. “A distribuição é o calcanhar de aquiles de Salinas”, adverte o investidor, que vê potencial principalmente no comércio de garrafas mais sofisticadas.
Apesar de buscar a profissionalização de parte da cadeia produtiva da cachaça de Salinas, Andriani garante que manterá a forma de produção artesanal, como modo de garantir a qualidade e o status do produto. O liquido é mantido por dois anos, em média, em barris de madeira de umburana, bálsamo, jequitibá-rosa e carvalho francês. Até carros de boi são usado na produção. “Foi isso aqui que deu status à cachaça brasileira. Antes era pinga. E, para trabalhar com artesanal, é preciso respeitar as origens”, afirma. Outro fator importante para que seja preservada a fórmula é que no mês passado o Instituo Nacional de Produção Industrial (INPI) concedeu o título de indicação geográfica à cachaça produzida em Salinas, mas para que a marca o receba, é preciso respeitar alguns métodos de preparo.
Titulação
A confirmação do título de indicação geográfica aos produtores de cachaça na região de Salinas deu maior ânimo também ao paulista. Andriani acredita que, com o tempo, ocorrerá o mesmo processo de reconhecimento de qualidade que obteviveram e o conhaque e o champanhe na França. Os dois são característicos de duas regiões francesas (Cognac e Champagne) e, com a indicação geográfica, os rótulos fabricados nessas regiões passaram a ser procurados pelo nome da localidade. “Com o passar dos anos e a difusão do título, as pessoas dirão nos bares: ‘Quero tomar uma Salinas’. Aí o garçom vai apresentar as garrafas feitas na região. É como pedir um champanhe”, vislumbra o investidor.
Além disso, a abertura de novos mercados para o setor artesanal fora de Minas deve permitir que se interrompa o ciclo ocioso de produção. Atualmente, as fábricas trabalham quase 40% abaixo do limite de rendimento. Sem a necessidade de novos investimentos nessas unidades, a expectativa da Apacs é de que, nos próximos dois anos, o volume produzido atinja o limite. A única medida necessária para isso é o aumento de 200 hectares nos canaviais, o que dá apenas oito hectares por produtor. Com isso, a expectativa é de que o volume produzido aumente 2 milhões de litros por ano, atingindo 7 milhões de litros ao ano em 2014.