domingo, 6 de fevereiro de 2011

CACHAÇAS DE ALAMBIQUE GANHAM MERCADO E FAZEM PRECONCEITO CONTRA BEBIDA DIMINUIR

Com a marvada pinga/É que eu me atrapaio/Eu entro na venda e já dou meu taio/Pego no copo e dali nun saio/Ali memo eu bebo/Ali memo eu caio. Esses versos de Ochelsis Laureano fizeram grande sucesso na voz de Inezita Barroso, nos anos 50 do século passado. Ao mesmo tempo em que destacava a mais tradicional bebida brasileira, a música também ressaltava um pouco do aspecto preconceituoso que por muito tempo “perseguiu” a aguardente de cana, que, com visão mercadológica, passou a ser “vendida” como “cachaça”, com olhos voltados, principalmente para o mercado internacional.

Sem se atrapalhar e muito menos cair, como expresso na composição musical, o bebedor da refinada cachaça brasileira hoje encontra no mercado produtos verdadeiramente de qualidade e que já rivalizam no mercado externo com bebidas anteriormente consi-deradas imbatíveis, como o rum cubano/jamaicano ou a tequila mexicana.

A visão de uma bebida de “giro rápido”, ou seja, processada e logo colocada no mercado, foi sendo substituída por um entendimento baseado no refinamento, na obtenção de um produto de ótima qualidade, de sabor intenso e que permita a quem bebe ter contato com os toques amadeirados dos barris nos quais essas “cachaças” repousaram. Ou seja, a visão dos anos 50 de que a “marvada pinga” só tinha a função de derrubar quem a bebia se perdeu no labirinto do tempo e deu lugar a um perfil profissional de produção de uma bebida fina e de qualidade.

As cachaças que conquistam o mercado são as chamadas “de alambique”, isto é, não possuem o perfil industrial de algumas marcas que ainda hoje são predominantes nos bares. Essas cachaças possuem uma estrutura de produção, em geral, bastante parecido: são desenvolvidas por pequenos produtores e trazem embutida uma tradição familiar.

De marcas que já se consolidaram e possuem uma presença considerável em vários mercados, como a Tabúa, àquelas que estão dando seus primeiros passos regionais, como a Piraporanga, o perfil é basicamente o mesmo: produto de qualidade e uma tradição por traz do negócio.

“Meus tios-avós vieram da Itália e ele faziam essa cachaça na cidade de Jaborandi. Em certo momento, eles resolveram interromper a produção e nós buscamos retomar aquela receita antiga deles e fazer um produto de alta qualidade e artesanal”, disse Luiz Henrique Parro, diretor da Piraporanga, que agora tem sua sede na cidade de Barretos.

Os especialistas indicam que o segredo mercadológico da cachaça, assim como ocorre com o café ou com o vinho, reside na qualidade. O envelhecimento do produto é feito em tonéis de madeiras diferenciadas, como carvalho, bálsamo e jequitibá, o que confere à bebida um sabor único e também uma coloração característica. Há também cachaças de qualidade que não passam por tonéis de madeira, mas que ficam reservadas em grandes dornas de aço. Esse tipo de bebida é translúcida, com um sabor característico e intenso.

Um dos sinônimos de cachaça é o município mineiro de Salinas, que produz diversas marcas de alta qualidade da bebida, como Seleta, Boazinha, Salineira, Hanavilhana, Sabiá e muitas outras. A produção da cachaça nessa cidade do norte de Minas Gerais é tão arraigada que um pedido de identificação geográfica para o produto tramita no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual. Com a identificação, os produtores terão um instrumento a mais para agregar valor à bebida.

Hoje a região de Salinas conta com uma produção de cerca de 5 milhões de litros de cachaça ao ano, com um faturamento de mais de 8 milhões de reais.

Em São Paulo a “indústria” da cachaça artesanal também se desenvolve. O setor, inclusive, conta com uma entidade, a Associação Paulista dos Produtores de Cachaça de Alambique, com um envolvimento de 15 empresas que produzem 40 mil litros ao ano. A entidade tem contratos firmados com o Sebrae e com a Universidade de São Paulo para desenvolver um programa de melhoria para o produto e também para a criação de um selo específico, visando diferenciar a cachaça paulista no mercado. Outro objetivo do selo paulista é buscar criar um novo entendimento no mercado para o produto local, que, em geral, está atrelado às marcas tradicionais (industriais), já que várias das marcas líderes nesse segmento estão estabelecidas no Estado.

Região — Em breve a região passará a contar com um projeto voltado para a produção de cachaça ar-tesanal. A Fa-zenda Santa Júlia, na cidade de Garça, irá passar a comercializar nos próximos meses a “Ricca Cachaça”, desen-volvida sob os mais rigorosos aspectos de obtenção de uma bebida fina e de qualidade.

Atualmente a Fazenda já conta com um amplo espaço no qual estão armazenados centenas de tonéis, nos quais a cachaça descansa e vai adquirindo as características da madeira. Os proprietários da Fazenda preparam o projeto já com a perspectiva de também exportar a “Ricca Cachaça”. (Vigor Econômico)