segunda-feira, 4 de março de 2013

Envelhecimento da aguardente e cachaça

Na produção da cachaça, o processo de destilação varia do artesanal – em alambiques de cobre e envelhecimento em tonéis de madeira – às gigantescas colunas de aço inox utilizadas nas indústrias para produção em larga escala. “Algumas dessas indústrias estão mais preocupadas com o volume de produção e não conseguem controlar a qualidade do sabor, por isso as de alambique são mais requintadas”.

É o tipo da madeira que confere o “bouquet”, ou seja, o aroma à cachaça, e também pode interferir na sua cor. As jovens costumam ser límpidas, chamadas no mercado de pratas, e as versões ouro são envelhecidas em tonéis de madeiras mais marcantes. É tudo uma questão de gosto. O carvalho é característico e inconfundível, deixando a bebida com um amarelo-escuro e com notas de baunilha.

Especialistas são unânimes ao dizer que o cobre influi no sabor da bebida, mas a parte fundamental do processo é o período de descanso da bebida e seu envelhecimento. O líquido fica em repouso em tonéis de madeira, onde a troca de gases regula a acidez da bebida, responsável por provocar o ardor na boca.

O período de repouso pode variar de seis meses a um ano e meio para as cachaças chamadas jovens ou até doze anos para as envelhecidas.

Envelhecimento da aguardente e cachaça

A aguardente de cana e cachaça recém-destilada, de coloração branca, apresenta um sabor agressivo e levemente amargo. O envelhecimento, além de melhorar o aroma e o sabor, pode modificar a coloração, de branca para amarelada, e tornar a bebida macia, aveludada, atenuando a sensação secante do álcool. O envelhecimento em tonéis de madeira é mais recomendável. A madeira internacionalmente admitida como sendo a melhor para bebidas é o carvalho, seja de origem francesa ou americana.

As condições climáticas sugeridas para o envelhecimento são: o uso de local fresco, com temperatura entre e 20 °C, umidade relativa de 70 a 90%, e com arejamento adequado.
O envelhecimento em tonéis de madeira é considerado uma das etapas mais importantes no processo de fabricação da aguardente de cana e cachaça, No Brasil ainda é considerada etapa opcional pela Legislação Brasileira. Esta, define cachaça envelhecida como a bebida que contém, no mínimo, 50% de cachaça ou aguardente de cana envelhecida em recipiente de madeira apropriado, por um período não inferior a um ano, podendo ser adicionada de caramelo para a correção da cor.

A realização de blend’s, ou misturas entre bebidas envelhecidas e bebidas recém destiladas, é um procedimento tradicionalmente empregado por tradicionais produtores de várias regiões do mundo, chegando inclusive a ser um diferencial entre uma ou outra marca de destilado.

O recipiente para o envelhecimento da aguardente deve ter capacidade máxima de 700 litros. O envelhecimento de bebidas consiste em armazená-las adequadamente em barris de madeira por um tempo determinado, ação que produz mudanças na composição química, no aroma, no sabor e na cor da bebida e, portanto, na qualidade sensorial. Durante o envelhecimento ocorrem inúmeras transformações, incluindo as reações entre os compostos secundários provenientes da destilação, a extração direta de componentes da madeira, a decomposição de algumas macromoléculas da madeira e sua incorporação à bebida e ainda as reações de compostos da madeira entre si e com os componentes originais do destilado.
Diferentes estudos já demonstraram que o envelhecimento da aguardente de cana em tonel de carvalho promove o aumento da aceitação e mudanças favoráveis no perfil sensorial. Com o decorrer do tempo de envelhecimento, novas características sensoriais são desenvolvidas, como aroma e sabor de madeira, aumento da intensidade e duração da doçura, coloração amarela e a diminuição significativa da agressividade e do aroma e sabor alcoólico.

O carvalho é uma madeira importada e seu custo torna-se dispendioso ao setor produtivo da aguardente de cana e cachaça envelhecida. A aguardente envelhecida apresenta aspecto, cheiro, cor, gosto e sabor de melhor qualidade. Por isso e pelo seu maior custo de produção, seu preço no mercado também é maior. É evidente que a aguardente envelhecida será de alta qualidade sensorial se apresentar esta característica quando nova. Uma aguardente de baixa qualidade continuará ruim após o envelhecimento. O período mínimo para o envelhecimento deve ser de doze meses.

O envelhecimento da cachaça por 48 meses em carvalho, demonstra que a aceitação da bebida tem aumento crescente para atributos como: cor, aroma, impressão global. Após este período em tonel de carvalho, a cachaça apresenta aroma de madeira, doçura inicial e residual, aroma de baunilha, coloração amarela, gosto inicial e residual de madeira pronunciados, sabor inicial e residual de álcool, significativamente inferior às obtidas com o tempo de envelhecimento inferior e submetido à mesma análise.

O tempo de armazenamento ideal deve variar de acordo com as características do barril (tipo de madeira, idade e tamanho) e com as condições ambientais do local de armazenamento (temperatura e umidade). Não é correto dizer que a bebida melhora de qualidade indefinidamente com o tempo de armazenamento. Quanto maior o tempo de contato do destilado com a madeira, maior será a extração de componentes, que, em excesso, podem incorporar um sabor amargo à bebida. O contato exagerado com a madeira também pode acarretar um aumento indesejável da acidez volátil, dependendo das condições do barril ou tonel.

Barris de Carvalho Francês
Utiliza-se o carvalho séssil (Quercus sessilis), considerado superior aos demais pelo seu grão fino e abundante oferta de componentes, tais como baunilha e seus derivados, taninos, fenóis e aldeídos voláteis. Os taninos são sedosos, transparente e transmitem uma sensação de doçura combinada com sabores de frutas delicadas que persistem na boca. Aprecia-se notas de especiarias e amêndoas torradas, combinados com sabores de frutos vermelhos maduros e notas de pêssego, frutas exóticas e aromas florais como jasmim e rosa. Os bosques de carvalho francês são certificados com a norma do PEFC.

Barris de carvalho americano
O carvalho branco norte-americano (Quercus alba) ganhou aceitação considerável nos países maiores produtores de vinho. Ao contrário do carvalho francês, o qual aproveita apenas 20 a 25% do carvalho, o maericano pode ser serrilhada, tornando-o mais acessível. Liberação de oxidação mais acentuada e mais rápida de aromas ajuda bebidas a perder a sua adstringência e dureza mais rapidamente, o que torna a madeira favorita para períodos menores (6 a 10 meses).

Madeira interage harmoniosamente, proporcionando uma ampla variedade de aromas complexos, taninos suaves e atraentes. O bouquet é leve, com aromas de madeira, cravo, rapé, torradas e café torrado, combinados com aromas de framboesa, amora e groselha.

Investimentos em qualidade e certificação dão novo status à cachaça


Bebida antes vista com preconceito, a cachaça tem conquistado um público mais sofisticado, a produção vem aprimorando a qualidade e obtendo mais certificações.  Embora a exportação ainda seja tímida, vários esforços têm sido feitos para levar o produto mais legitimamente nacional para outros países. A FINEP já investiu cerca de R$ 3,3 milhões nos últimos oito anos, especialmente na instalação de laboratórios de análise específicos para garantir a qualidade da bebida.

Boa parte do caminho para uma produção mais profissionalizada e um maior ganho de valor agregado vem por meio de certificações. Nesse ponto, o estado de Minas Gerais foi pioneiro, e a Associação mineira dos Produtores de Cachaça de Qualidade (AMPAQ) tem seu próprio selo de qualidade. Iniciativas semelhantes se espalharam por outras regiões, especialmente no restante do Sudeste, Nordeste e Sul. No Rio de Janeiro, estado com pequena produção, os alambiques têm se sofisticado e investido na busca da certificação, com olhos no mercado externo. O primeiro selo de indicação geográfica (IG) para cachaça, emitido pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), foi dado a alguns alambiques da cidade de Paraty, palavra que é um dos sinônimos de cachaça no dicionário. Cachaças da região de Salinas (MG) devem ser as próximas a receber o selo IG.

Recentemente, a primeira cachaça fluminense obteve uma certificação de qualidade, pelo Instituto Nacional de Tecnologia (INT). Em 2007, o INT passou a ser a primeira – e ainda a única - instituição no estado do Rio a certificar cachaça. O projeto nasceu no Programa de Apoio Tecnológico à Exportação (Progex), gerido pela FINEP, coordenado por Luiz Carlos Correia Pinto, coordenador executivo da Rede de Extensão Tecnológica do Sistema Brasileiro de Tecnologia (Sibratec/RJ). Hoje, a iniciativa de melhoria da cachaça fluminense continua ganhando impulso, com apoio do Sebrae, via Sibratec Exportação. Nessa empreitada, foi realizado um levantamento dos melhores alambiques do RJ e, como resultado, foram selecionados 30. Desses, definiu-se que 15 tinham potencial para exportação, que receberão financiamento com vistas a 15 certificações.

Os técnicos fazem avalição de conformidade, estabelecida por vários quesitos do processo produtivo, como controle ambiental, segurança alimentar, higiene e qualidade fisicoquímica do produto, entre outros. “No momento, os alambiques estão adequando os processos. Nós também organizamos palestras para desmistificar a certificação como um bicho de sete cabeças”, explica Lilian Grace Aliprandini, extensionista tecnológica do INT. “Estamos atrás do restante do Brasil em termos de certificação, principalmente dos grandes polos produtores de minas, Pernambuco e São Paulo”, diz Lilian. Apesar desse relativo atraso, a cachaça produzida no Rio tem se mostrado de excelente qualidade. “São as melhores em termos de higiene, segurança e outras conformidades”, afirma Lilian. Cerca de 8% da cachaça exportada pelo Brasil é produzida no estado, segundo dados do Centro Brasileiro de referência da Cachaça (CBTC).

O projeto conta com uma unidade móvel que já atendeu 13 alambiques, onde são realizados testes de verificação de qualidade, avaliações de níveis de contaminantes e qualidade da água, entre outros. Além das análises, há treinamento de boas práticas junto aos produtores. “Estamos partindo de um segmento que era um negócio de fundo de quintal, um hobby de família, para hoje ser consolidado com uma indústria de bebidas”, diz Luiz Carlos. “O potencial para exportação é grande. São Paulo levou a cachaça a granel para o mundo, e em vários países a caipirinha é um drink familiar. Minas tem um apelo imenso no mercado interno. Já o Rio pode aliar a qualidade especial de sua cachaça ao seu potencial turístico”, observa Lilian.

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