Na Antiguidade as aguardentes (eaux-de-vie) e os licores não eram conhecidos no Ocidente. Os primeiros a praticarem a destilação foram os povos do Extremo-Oriente. Quanto aos árabes, começaram a destilar o álcool nos primórdios da Idade Média, passando esse conhecimento aos europeus. Álcool, alambique, alquimia são todos termos de origem árabe, sendo o al o artigo em árabe.
Se o desejo de beber está na origem do vinho, o desejo de agradar está na origem do álcool. Os árabes diluíam um certo tipo de pó negro em água, faziam-no ferver, condensavam seu vapor e depois solidificavam o líquido final. Obtinham assim o khol, com o qual suas mulheres embelezavam os olhos, dando-lhes mais brilho.
Quando começaram a destilar os álcoois, deram ao líquido conseguido o mesmo nome do cosmético “al khol”, pois era fabricado pelo mesmo processo.
A técnica da destilação ganhou a Europa pela Espanha, onde foi introduzida pelos árabes durante a longa dominação. No século XIII, Arnaud de Villeneuve, alquimista do rei de Aragão, escrevia no seu Tratado sobre a Conservação da Juventude: “alguns chamam esse líquido de aguardente (eau-de-vie), e este nome lhe convém, pois ele faz com que vivamos por mais tempo”.
Para ele, o álcool era a panacéia buscada há tantos anos, o elixir da vida, velho sonho dos alquimistas. Por causa dessa origem obscura, a aguardente nos seus primórdios passava por ter propriedades mágicas e fins terapêuticos. As frutas e as plantas que eram misturadas ao álcool melhoravam seu gosto e, diziam, aumentavam seu poder medicamentoso.
Assim, no silêncio de seus monastérios e laboratórios, enquanto buscavam o elixir da longa vida, os religiosos e alquimistas do início do século XIV descobriram os segredos de fabricação dos primeiros licores.
O século XVIII marcará uma nova etapa na fabricação de licores com a chegada à Europa do açúcar de cana das Antilhas e as especiarias que lhes davam sabor.
No início do século XIX, M. Adam inventou um aparelho de destilação tão perfeito que retirava do álcool todo gosto indesejável e permitia obter, por misturas bem dosadas de grãos e plantas, os esprits que são, ainda hoje, a base dos licores.
O COGNAC
O Cognac, juntamente com o Armagnac, é a mais renomada aguardente de vinho e é obtido através da destilação de vinhos brancos de cepas selecionadas (Folle Blanche, Colombard, Ugni Blanc). Como a matéria-prima do Cognac deve ser uma uva fraca e ácida, usava-se, inicialmente, a Folle Blanche, bem ácida e aromática. Depois da dizimação dos vinhedos pela phylloxera, na segunda metade do século XIX, como a Folle Blanche mostrou-se inadaptada à enxertia, foi substituída pela Ugni Blanc, também conhecida por St.-Émilion (em Cognac) e Trebbiano (na Itália).
Os vinhos produzidos com essas uvas são destilados segundo o método charentês (de Charente) num alambique de repasse, através de 2 destilações sucessivas. A première chauffe dá o broullis de 27 a 30°, que retorna ao alambique e é fervido de forma regular por 12 horas. Isola-se então o álcool do início (tête) e o do fim da destilação (queue), guardando-se apenas a parte do meio (coeur). Apenas esta eau-de-vie, que se chama bonne chauffe, que alcançou de 69 a 72°, envelhecerá na madeira.
A extração de cor (até então é um líquido incolor), taninos e sabores é conseguida durante o estágio em barricas de carvalho. Com a evaporação, que ocorre através dos poros da madeira, o oxigênio vai oxidar, maturar e afinar o Cognac.
A evaporação é chamada de “parte dos anjos” e causa a perda de 3% do volume e redução de 1% do teor alcoólico por ano. Isso representa uma enorme perda de volume por ano, cerca de 20 milhões de garrafas.
Utiliza-se o carvalho da floresta de Limousin, próxima a Cognac, para a fabricação das barricas. O Maître de Chai faz a seleção dos Cognacs de várias regiões e os mescla. O caráter de cada Cognac obtido será resultado das proporções dessa mistura e do seu envelhecimento.
Antes de chegar ao mercado, o Cognac tem seu teor alcoólico reduzido para 40-45% , com a adição de destilados mais fracos da região ou água destilada. É permitida a adição de açúcar e caramelo à bebida.
LEGISLAÇÃO E REGIÕES
A legislação que regula a produção do Cognac é bastante severa, existindo uma série de leis para normatizar a origem, o envelhecimento e as diferentes apelações. A região se limita aos departamentos de Charente-Maritime e Charente, dentro da qual existem 6 zonas de produção ou crus, cada qual limitada por diferenças de terroir. São as seguintes, por ordem decrescente de qualidade:
• Grande Champagne
• Petite Champagne
• Borderies
• Fins Bois
• Bons Bois
• Bois Ordinaires
APELAÇÕES DE ORIGEM:
• Grand Fine Champagne Cognac - 100% Grande Champagne
• Fine Champagne Cognac - mínimo de 50% Grande Champagne - máximo de 50% Petite Champagne
• Petite Fine Champagne Cognac - 100% Petite Champagne
DENOMINAÇÕES QUANTO AO ENVELHECIMENTO:
• Três Estrelas – Quando seu componente mais novo tem, no mínimo, 30 meses.
• V. O. e V.S.O.P. – Very Old e Very Superior Old Pale – quando contiverem aguardentes cuja idade mínima seja de 4,5 anos.
• Extra, X.O. (Extra Old), Napoléon, Grande Réserve – feitos com aguardentes de, no mínimo, 6,5 anos, até 60 anos.
Lembramos que a idade se refere apenas ao componente mais novo do blended, sendo a média de idade bastante superior ao que se lê no rótulo. Além disso, só se computa o envelhecimento em carvalho, pois não existe evolução do Cognac após o engarrafamento.
Publicado na Revista Vinho Magazine – ano 2001